quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Um acidente de percurso ou como passei de dependente profissional a dependente emocional



Quando entrei na universidade tinha uma frase pronta para quem me perguntasse o que faria após o término daqueles dias estudantis, tão corridos e que muitas vezes cheguei a menosprezar. Era uma garota livre, estava com 17 anos quando assisti a minha primeira aula de graduação e podia levar qualquer menino para dormir comigo. Eu morava sozinha...! Mas ao contrário disso, preferia ficar até a biblioteca fechar e depois ir para casa dormir. Eu que sempre detestei disciplinas EXATAS, estava realizada com aulas de HUMANAS (Cursava Jornalismo). Parecia incrível, meu corpo também dava uma guinada junto com aquilo, fazia aulas de tudo que aparecesse: Teatro, Cinema, Roteirista de novela, Ajudante de pedreiro, enfim...

Havia tido o primeiro e último namorado aos 16 anos e como sempre fui muito desengonçada e focada EM MIM, nunca dei muita importância a relacionamentos. Estava COMIGO, nem lembrava o rosto do meu ex. Eu me sentia uma garota realmente interessante, por mais que não houvesse homens me ligando! Era EU que achava isso. Durante esse início de universidade, recebia elogios freqüentes de professores, ganhei uma bolsa para ser monitora na Graduação de Sociologia e fui convidada para escrever no jornal local, uma seção que trazia o título de “Minha primeira matéria”. Pode parecer que estou me promovendo falando tão bem assim de mim, mas eu era a Garota-de-carreira-promissora. Mal ia à calouradas, pensava em acordar cedo e pôr meus trabalhos em prática. Entrevistava gente, ia nos lugares mais inusitados possíveis e sempre escolhia TEMAS destoantes para que tudo fosse realmente um desafio.

Conheci o pai do meu filho numa dessas raves, ele tinha a mesma idade que eu. Mas, ao contrário de mim, não tinha terminado o segundo grau ainda, fazia o supletivo. Era um rapaz divertido, me deixava com as bochechas doloridas toda vez que me encontrava. Me elogiava tanto, do tênis que eu estava usando até a orelha com 8 brincos que a vaidade não deixou por menos, acabamos nos envolvendo e na primeira vez que transamos, sim, a primeira vez... eu engravidei. A camisinha não foi colocada direito e na hora de retirar derramou tudo em mim. A pílula do dia seguinte não era tão divulgada quanto hoje, então ficamos em alerta, mas nos AMANDO-PARA-SEMPRE. O que sentia por mim era o bastante, não me importava o que EU sentia, era o que ele sentia que me fazia gostar muito dele.

A menstruação demorava a vir, contei para o meu namorado. Comecei a enjoar sem parar, chegava a passar o dia inteiro no banheiro, vomitando um líquido amarelo (a bílis) e o pai do meu filho me levou a um lugar para fazer o teste. Não tive condições de buscar o resultado, fiquei do lado de fora enquanto ele ia até o laboratório. Me cumprimentou, dizendo “Parabéns, Mamãe!” Na mesma hora atirei-me na frente de carros, sim, quase fui atropelada.

Pegamos um ônibus e ele gritava alegre “Vou ser pai”. Eu estava paralisada, por quê não dizer paralítica? Sentia que alguém havia me mutilado, arrancado meus membros!

Meus professores quando souberam da novidade não conseguiam compreender. Senti que estavam decepcionados e que me julgavam BURRA DEMAIS. Havia perdido a credibilidade de mulher inteligente! O rótulo envolveu-me sem que eu pudesse contestar.

Quis abortar, quis voltar a ser a garota livre. O meu namorado parecia furioso enquanto eu dizia “Não vou ter uma criança, eu nem sei como cuidar de mim”. Nos separamos, claro que o motivo de eu querer abortar foi só uma desculpa para ele se safar da situação. Brigamos e não nos falamos até eu ir à maternidade parir.

Passei dois longos 8 meses conturbados. Sai da casa que dividia com mais 5 estudantes, pois era impossível dividir um banheiro que eu precisava estar 18 horas do dia. Após os apelos da minha mãe e a minha saúde frágil, voltei ao berço materno. Dormia sentada, estava robusta (Só conseguia comer purê de batatas com coca-cola) e carregava o filho de um homem que eu não amava.

Passei a exercitar as lágrimas, elas brotavam como capim. Eu tinha muita pena de mim, e ter pena de mim era um sentimento saído da loja!

Na madrugada que as contrações começaram, avisei para o pai do meu filho que se surpreendeu com meu telefonema. Ele, muito educado, disse que me visitaria no dia seguinte. Mas de madrugada fui à maternidade as pressas e ele nunca me viu grávida, nunca tocou a minha barriga que foi a moradia do seu filho por meses.

Meu filho era um bebê sorridente, não tinha secreções nasais, como a maioria, e sugava o leite como um bezerro treinado – Era uma mãe de sorte, dizia a enfermeira enquanto me presenteava com aquele mini-pacote-humano.

Olhei-o no berço ao voltar da maternidade, minha estada tinha sido rápida, e adormeci na saleta vizinha. Meu irmão, falecido, olhava-nos feliz e dizia “Que lindo sobrinho você me deu”. Despertei, era tão real, tinha certeza que ele estava ali por perto e tinha nos trazido um pouco de fé. Acordei, observei longamente o meu bebê no berço azul-marinho e agradeci por estar ali.

Zíngara








Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...












Postado por
CF


às
14:23












Nenhum comentário:

Postar um comentário